início bocadomangue Mario Moscatelli

COMO DE PRAXE

Um dos graves problemas de algumas sociedades é o patológico hábito de não olhar para o passado. Dessa forma fatalista de lidar com a realidade, os erros evitáveis são repetidos indefinidamente até o fim dos tempos.

Essa história do vazamento de óleo do campo do Frade é um desses possíveis casos.

No ano de 2.000, não posso esquecer da noite que eu acabara de retornar de Paraty, onde um manguezal vinha sendo loteado sem qualquer incômodo por um coronel daquele município, quando meu telefone tocou me alertando que estava ocorrendo um vazamento de óleo na baía de Guanabara por conta da ruptura de dutos da Petrobrás. Há de se destacar que esses mesmos dutos tinham tido problemas em 1997 e lambido manguezais e a baía de Guanabara na periferia da Reduque.

Pois bem, como a empresa estatal está acima do bem e do mal, nada fez de efetivo de 1997 até 2000, quando, como era de se esperar, deu-se a lambança geográfica, onde aproximadamente 1/4 da baía de Guanabara foram “asfaltados” incluindo-se manguezais, praias e costões rochosos.

Por um lado a Petrobrás tentava permanentemente reduzir o tamanho do problema, dizendo que o volume despejado era X, que depois virou 10X, 100X até que chegamos aos estimados UM MILHÃO E QUATROCENTOS MIL LITROS de óleo.

No combate ao acidente, faltava tudo. Faltavam bóias, embarcações, estratégia, pessoal habilitado, enfim um patético show de irresponsabilidade e certeza na nossa, mais do que famosa IMPUNIDADE, a mesma que autoriza qualquer um a matar bêbado no volante e sair livre, leve e solto de qualquer delegacia, desde que pague uma fiancinha.

O óleo invadiu manguezais, dizimando toda sua fauna, principalmente a carcinofauna em pleno período reprodutivo. Nas águas da baía, biguás, garças, maguaris, socós, morriam aos montes empapados no óleo. Algumas tentativas com êxito eram efetuadas por biólogos contratados pela estatal no sentido de salvar algumas aves. No entanto o jogo entre a degradação e a irresponsabilidade contra o processo de salvamento era desleal. Pescadores sem poder trabalhar, água de poços contaminados por óleo, enfim um verdadeiro caos ambiental e sócio-econômico tomou conta da já mais do que degradada baía de Guanabara.

Chamo a atenção que constatei e participei pessoalmente de todos os detalhes desses acidentes de 1997 e 2.000, pois no primeiro era funcionário da Secretaria Municipal de Meio Ambiente da cidade do Rio de Janeiro e no segundo era assessor da Secretaria de Meio Ambiente do Estado, podendo ver de perto toda a arrogância e irresponsabilidade de quem se considera acima das leis, como de praxe.

Multa de CINQUENTA MILHÕES DE REAIS foi dada à Petrobrás pelo IBAMA, e o dinheiro infelizmente acabou não revertendo efetivamente para quase nada em benefício da baía. Coisas tipicamente tupiniquins, como de praxe.

Passaram-se inúmeros anos desde então, o processo na justiça ficou rolando até que um dia chegou-se a seguinte situação: Todos os funcionários da Petrobrás julgados foram absolvidos! Ou seja, o vazamento de 2.000, foi fruto provavelmente de um ato terrorista de alienígenas, ou talvez bioterrorista de caranguejos com cérebro, visto que eu não sei quais os argumentos que foram aceitos pela justiça para considerar todos os irresponsáveis sem qualquer reponsabilidade!

Ao saber do resultado, lembro que escrevi um artigo denominado “O Mal ambiental compensa”, pois em tantos outros casos, envolvendo o rio Paraíba do Sul, manguezais aterrados no litoral sul fluminense, nunca em tempo algum, pude constatar, algum prejuízo doloroso ou cadeia para os degradadores. Como já disse, tendo bom advogado e bons contatos, até os mortos ressuscitam por aqui.

Enfim os anos passaram e com toda a pompa e circunstância chegou à era do Pré-Sal e com ele toda a força da cobiça pelas receitas dos royalties , onde em resumo, mesmo sobre os contratos já existentes, os demais estados da federação querem colocar a mão na grana que hoje se destina inteiramente aos estados produtores. Nesta nova e esdrúxula divisão de recursos, fica parte da grana para os demais estados não produtores e o restante para os produtores junto com os impactos ambientais e sociais inerentes desse tipo de atividade econômica. Como de praxe, no Congresso Nacional, onde prevalece a amoral política com os lemas salve-se quem puder e farinha pouca, meu pirão primeiro, questões de natureza legal visando evitar a tal insegurança jurídica que podem afetar não apenas a área do petróleo como os demais setores da economia são relegados à sarjeta. E nesse momento chegamos ao atual acidente.

No dia 13 de dezembro de 2011, recebo o telefonema do delegado da polícia federal Fábio Scliar me solicitando apoio com perito no caso do novo vazamento da empresa CHEVRON. Como estava fora do Rio de Janeiro, indiquei outro profissional que pudesse dar conta do recado.

Acompanhando o noticiário apresentado pela mídia, parece que estou vendo o mesmo filme de novo, como se fosse um programa “não vale a pena ver de novo”.

COMO DE PRAXE
"O óleo invadiu manguezais, dizimando toda sua fauna, principalmente a carcinofauna em pleno período reprodutivo. Nas águas da baía, biguás, garças, maguaris, socós, morriam aos montes empapados no óleo."


As avaliações do tamanho do derrame são completamente desencontradas como de praxe. Como de praxe também é a avaliação subestimada da empresa poluidora. Portanto vamos às estimativas de quantos barris vazaram:

CHEVRON-882 barris

ANP (Agência Nacional de Petróleo do PCdoB)-1.400 à 2.310 barris

Geólogo John Amos (ong SkyTruth) – 15.000 barris

De fato, do alto, tanto de helicóptero como de satélite as mentiras oficiais não resistem às imagens.

Somem-se a essa discrepância do número de barris despejados, outras dúvidas a respeito se o vazamento parou ou não, da qualidade e a disponibilidade dos equipamentos utilizados pela empresa, contratação de mão de obra não regularizada, a ausência de equipamentos que deveriam estar à disposição no caso de acidentes que não estão, enfim uma verdadeira da casa da mãe Joana, como de praxe!

Aí eu me pergunto: Por onde anda a fiscalização da ANP do PCdoB e do IBAMA que não vê P.N? Aliás, só vê depois que a lambança está de tamanho geográfico. Aliás, ao IBAMA são fornecidos equipamentos e mão de obra qualificada para dar conta para o tamanho do perigo que representa a prospecção, produção e transporte de petróleo?

Posso adiantar que eu duvido que o IBAMA tenha condições de dar conta desse abacaxi ambiental, como também de outros bem menores, visto que infelizmente a fiscalização ambiental para os políticos da situação e oposição, deve ser um daqueles incômodos que como certa vez um ex-chefe de estado brasileiro vociferou, que por ele acabava com o IBAMA e consequentemente facilitava a vida dos “cumpanheiros”!

Agora convenhamos, esse vazamento vai virar peça de propaganda para os governos dos estados produtores, visto que o argumento é forte diante da clareza dos eventos.

Já vejo autoridades fazendo visitas às baleias-jubarte, golfinhos-pintados-do-Atlântico e à golfinhos-narizes-de-garrafa, adoentados e internados em hospitais da rede pública. Coitados, vão morrer rapidinho!

Mas enfim, independente do que vai dar essa história, com multas astronômicas ou não, indiciamentos ou não dos irresponsáveis, animais mortos, fundo do oceano coberto de óleo, de uma coisa eu sei: Até agora não sei no que deu a história denunciada, publicada na mídia e vistoriada pela polícia federal em relação ao lançamento de óleo pela Reduque no rio Iguaçu e nos manguezais da região bem debaixo de nosso nariz. O secretário Minc disse pela imprensa que ia dar uma multa de TRÊS MILHÕES DE REAIS. Depois fiquei sabendo extra-oficialmente que segundo avaliações do órgão ambiental estadual o material coletado junto com a PF, não era significativo para caracterizar o lançamento como fosse óleo. Será que eu entendi certo? Ou seja, aquela lambança toda na qual eu meti a mão era então o que? Vinagre? Óleo de oliva extra-virgem? Efeito especial? E aqui fico esperando no que vai dar mais esse desrespeito ambiental efetuado pela toda poderosa estatal do petróleo, super-patrocinadora de n projetos disso e daquilo, e sentada, deitada num oceano de dinheiro, tem a mais completa certeza que pode continuar destruindo o que já está quase em frangalhos ambientalmente.

Ouço por parte das autoridades que multa é apenas um esparadrapo e que a solução passa mesmo pela assinatura de termo de ajuste de conduta de um BILHÃO DE REAIS como se isso fosse autorização para qualquer empresa continuar à degradar. Realmente é muita grana, mas além do marketing do tac, seria produtivo ver esse dinheiro sendo utilizado para a melhoria na realidade da baía de Guanabara, pois o tempo passa, o tempo voa e nada acontece, como de praxe.

Destaco que um bilhão, um trilhão, ou sabe-se mais quanto dinheiro não foi, não é e nuca será a certeza de um final feliz, visto que se mal utilizado, desviado, super-faturado, como de praxe, não irá gerar absolutamente nenhum resultado, como de praxe.

Vamos ver no que vai dar, como de praxe.

Para quem não lembra, algumas das fotos que mostram as conseqüências da irresponsabilidade técnica e da certeza da impunidade na baía de Guanabara em 2.000.

Mario Moscatelli - Biólogo - MSc. em Ecologia

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