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Origem dos mamíferos

Origem dos mamíferos: Fósseis de pequenas espécies descobertas no Rio Grande do Sul podem ser os ancestrais mais próximos dos maiores animais de hoje

Origem dos mamíferos

30/7/2020 ::  Marcos Pivetta / Pesquisa FAPESP.  CC BY-ND 4.0

Qualquer paleontólogo sabe que os mamíferos descendem de alguma forma de cinodonte, vasto grupo de animais – extintos, como os dinossauros – caracterizado por ter crânio e dentes semelhantes aos dos atuais cachorros.

Origem dos mamíferos
Cynognathus, um cinodonte do Triássico da África do Sul. Arte em desenho de Nobu Tamura

Os cinodontes pertenceram ao grupo dos sinápsidos, que serviu de transição entre os répteis e os mamíferos.

O que falta é precisar qual linhagem de cinodonte gerou, há cerca de 210 milhões de anos (mais ou menos a época em que os dinossauros surgiram), os primeiros seres com as características ósseas que hoje definem um mamífero: quatro tipos de dentes diferenciados funcional e anatomicamente, ouvido médio com três ossículos condutores de som e crânio avantajado.

Por reunirem pioneiramente esses traços ósseos e, provavelmente, apresentarem sangue quente, pêlos no corpo e glândulas produtoras de leite para a prole, esses bichos foram os exemplares primordiais dos futuros mamíferos, entre eles o homem.

Talvez nunca se determine com precisão que espécie de cinodonte deu o último passo em direção aos mamíferos, mas paleontólogos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e do Museu Argentino de Ciências Naturais acreditam ter encontrado importantes peças desse quebra-cabeça filogenético.

Dia Mundial dos Animais
Dia dos Animais

A partir da análise de vários fragmentos fósseis de pequenos répteis – do tamanho de uma caneta e semelhantes a ratos ou esquilos selvagens – resgatados nos dois últimos anos na região gaúcha de Santa Maria, a cerca de 200 quilômetros de Porto Alegre, centro do Estado, os pesquisadores identificaram dois novos cinodontes – que chamaram provisoriamente de Brasilitério e Brasilodonte – com características anatômicas para serem os ancestrais mais próximos dos mamíferos primordiais.

Brasilitério e Brasilodonte

“Esses répteis pré-mamalianos do Brasil podem ser o grupo irmão dos mamíferos”, diz o renomado paleontólogo argentino José Bonaparte, 73 anos, que descobriu os ossos petrificados das duas espécies juntamente com pesquisadores do Instituto de Geociências da UFRGS, onde é pesquisador visitante, com bolsa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

“Esses animais, retirados de rochas do período Triássico Superior – com idade geológica estimada entre 230 e 205 milhões de anos atrás -, não eram mamíferos, mas sua evolução estava claramente orientada nessa direção.” Por isso receberam nomes que remetem a esse grupo animal. Brasilitério quer dizer “mamífero do Brasil”, enquanto o Brasilodonte tem dentes (odon) de mamífero e seus pós-caninos, usados para triturar, formam quatro ângulos retos. A maioria dos fósseis encontrados são crânios completos ou parciais, com mandíbulas e dentes preservados. Foram resgatados outros ossos, mas nenhum esqueleto inteiro. Ainda este mês, pesquisadores da UFRGS e técnicos do museu argentino voltariam à região de Santa Maria em busca de mais fósseis.

Expedição paleontológica
Expedição paleontológica

O confronto das formas do crânio, mandíbula e dentes desses animais com os do Morganucodon – um dos mamíferos mais antigos (cerca de 200 milhões de anos) com material fóssil de boa qualidade e que tinha 15 centímetros de comprimento e se parecia com um rato selvagem – torna os achados gaúchos fortes candidatos a serem os melhores representantes da linhagem de cinodontes que desembocou nos mamíferos.

Cinodonte ancestral 

“Os cinodontes do Rio Grande do Sul apresentam um tipo de dentição carnívoro-insetívora, sobretudo na mandíbula, comparável à dos primeiros mamíferos”, afirma Bonaparte.

Ele acredita que o Brasilitério produziu descendentes que, gerações mais tarde, podem ter levado tanto ao mamífero primordial Morganucodon como ao Brasilodonte, animal com maior número de características de mamífero. Em outras palavras, a linhagem do Brasilitério pode ter sido ancestral tanto de sinápsidos muito parecidos com mamíferos quanto dos primeiros mamíferos.

Por ora, os fósseis do Brasilitério não parecem passíveis de análises tão aprofundadas quanto os do Brasilodonte, e os pesquisadores não chegam a rotular os minicinodontes gaúchos como pais de todos os mamíferos. Em vez de enfatizar a noção de linhagem paterna e filial, preferem um conceito mais preciso do ponto de vista científico: o de grupo irmão.

Fóssil vivo
Fóssil vivo. Equidna.

Se suas teorias se mostrarem corretas, o Brasilodonte e o Brasilitério deverão tomar o lugar de duas famílias de pequenos cinodontes, os tritylodontídeos e os trithelodontídeos (também chamados ictidossauros), encontrados em várias partes do mundo e que disputam há tempos a primazia de ser o grupo irmão mais próximo dos animais de pêlo e sangue quente.

“Nossos achados podem ajudar a entender melhor a origem dos mamíferos e mostrar quais linhagens de cinodontes participaram do processo de transição dos sinápsidos em direção a esse tipo de animal”, comenta o paleontólogo Cesar Schultz, da UFRGS, co-autor dos estudos de Bonapartesobreos minissinápsidos pré-mamalianos gaúchos.

Fonte: Revista FapespA origem dos mamíferos

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