bocadomangue
Mario Moscatelli
FELIZ ANO VELHO
Uma
análise do histórico de degradação
ambiental da laguna Rodrigo de Freitas, do início de sua
ocupação até a recente briga entre a Prefeitura
e o Governo do Estado, onde cada uma das esferas nega a paternidade
do filho feio que bóia nas águas da Lagoa, refletem
bem os motivos que conduzem a região metropolitana do
Rio de Janeiro rapidamente em direção ao caos ambiental. A laguna Rodrigo de Freitas desde o início de sua ocupação gerou interessantes descrições, atualmente quase que inacreditáveis à seu respeito. No início do século XIX, John Luccock afirma que a laguna " é funda, de água geralmente doce e notavelmente cristalina.... em seu leito abundam os mariscos e outras conchas pequenas. É sujeita por vezes a fortes rajadas de vento e quando ocasionalmente o mar transpõe a restinga, muitos peixes de água doce padecem".
De 1887 até os dias de hoje, inúmeras intervenções ocorreram tanto viabilizando o processo de ocupação como no sentido de tentar resolver e muitas vezes agravando os problemas ambientais locais, interferindo diretamente na salinidade e qualidade das águas, na dimensão original da laguna e conseqüentemente em toda a sua biota. A área original da laguna foi progressivamente sendo reduzida em função
das propostas de saneamento e principalmente visando à obtenção
de novos terrenos para o crescimento urbano. Em 1922 sugere-se o aterro das
margens alagadiças, representando a supressão de uma área
de1.345.800 metros quadrados, além da criação das ilhas
artificiais da Draga e dos Caiçaras. Enfim,
pode-se ter uma idéia definitiva da alteração
espacial da laguna Rodrigo de Freitas quando compara-se a cada época
analisada a redução da área correspondente. Em
outro relatório datado de 1961, intitulado " O problema
Sanitário
da Lagoa Rodrigo de Freitas" do engenheiro Enaldo Cravo Peixoto, afirma-se
que em 1953, num período de intensa urbanização de
todos os bairros perilagunares, a Superintendência de Urbanização
e Saneamento ao assumir a direção de serviços de esgotos,
encontrou ".... as cinco estações de bombeamento
da antiga Inspetoria construídas nas margens da Lagoa, funcionando
apenas até as
4 horas da tarde e extravasando, sistematicamente, esgotos para a Lagoa
Rodrigo de Freitas". Some-se a isso, ainda em 1953, "a
elevatória
chave do sistema de esgotos da antiga Cia. City, construída em 1896,
já se apresentava totalmente obsoleta..." (Peixoto, 1961). Apesar das inúmeras autoridades nas mais variadas situações e épocas nos momentos de exposição sob o olhar inquisidor da sociedade se defenderem sob a argumentação que as mortandades de peixes já ocorriam mesmo antes do processo de urbanização, os mesmos administradores públicos sempre se esqueceram de informar quais as causas que geravam na fase de pré-urbanização as mortandades, sua freqüência bem como o volume de peixes mortos. Sem
dúvida, após inúmeros trabalhos desenvolvidos
seja por pesquisadores estrangeiros como brasileiros, chega-se a conclusão
que as características ambientais pré-urbanização
da laguna sempre apresentaram um equilibro delicado, seja pelo grande
volume de matéria orgânica trazida pela sua bacia hidrográfica
proveniente do maciço da Tijuca lançado em suas águas
como pelo contato esporádico com o mar, origem de processos
biogeoquímicos
e de estratificação físico-química que
agiam como potentes tensores. Também é muito claro que
a partir da urbanização,
os tensores naturais foram amplificados, gerando como resposta mais
evidente as freqüentes mortanda Inúmeras foram às mortandades que ocorreram
repetidamente, sendo a partir de 1944 que as mesmas se tornaram cada
vez mais freqüentes e
no fim da década de 60, atingindo números progressivamente
também
maiores, quando morriam de 200 a 300 toneladas de peixes por ocorrência
(Jornal do Brasil, 1976). Salienta-se que em outubro de 1971, o Departamento
de Limpeza Urbana, retirou cerca de 500 toneladas de peixes mortos
(Leonardos, 1974). A
partir do tombamento legal do espelho dágua ocorrido em 1986 e a execução
no final da década de oitenta de um conjunto de obras que estancaram
o lançamento generalizado de esgoto nas águas da laguna Rodrigo
de Freitas, foi iniciado um período de franca recuperação
ambiental do ecossistema e de sua redescoberta por parte da população,
transformando a região como uma das mais importantes alternativas de
lazer na cidade do Rio de Janeiro como se verifica na manchete do Jornal O
Globo: "Lagoa volta ao páreo de cartão postal do Rio" de
30/06/91. Salienta-se também o início do gerenciamento efetuado
pelo autor desse artigo da vegetação perilagunar com a recuperação
das formações de manguezais, eliminadas pelos consecutivos aterros
que em menos de uma década produziram seus efeitos no incremento da
biodiversidade principalmente de crustáceos e aves. Apesar das inúmeras denúncias efetuadas seja por meio de todos os tipos de mídia e às diversas esferas do poder público, não tardaram a aparecer de maneira intensa as conseqüências do descaso ambiental com o qual as autoridades trataram de não resolver os problemas insistentemente denunciados. Em
dezembro de 1999, morriam 4 toneladas de peixes junto ao Parque
do
Cantagalo, o que gera das autoridades estaduais
uma reação pirotécnica,
que apesar de devidamente informadas da gravidade da situação,
de fato nada fizeram para reverter o processo que iria a
fevereiro de 2000 conduzir a morte de 140 toneladas de peixes
e paralisar
ambientalmente e economicamente
a vida da laguna. - Idade da rede de esgoto das regiões periféricas
a laguna Rodrigo de Freitas: Salienta-se
que algumas intervenções
como a construção
da galeria de cintura e a retirada parcial do lodo do
fundo da laguna, já geraram
resultados positivos diretamente na ausência de
novas mortandades desde o carnaval de 2002, período
da última grande mortandade. No entanto
os graves problemas de saneamento ainda persistem, onde
a rede de drenagem de águas pluviais vem sendo
progressivamente incorporada extra-oficialmente à rede
de esgoto, transformando os canais da Lineu de Paula
Machado, General Gárzon,
Jóquei e Visconde de Albuquerque em valões
de esgoto em plena zona sul da cidade do Rio de Janeiro,
associado a lançamentos de esgoto
em diversas galerias de águas pluviais. ois é, lendo esse breve relato e relembrando o esgoto na Lagoa, as praias de Copacabana e São Conrado com valas negras, praia da Barra nos trechos entre o Quebra-mar e Pepê comprometidos em sua balneabilidade, lagoas da baixada de Jacarepaguá podres, percebe-se que historicamente a maioria dos administradores públicos não teve e continua não tendo NENHUM compromisso com a qualidade de vida da população e quer mesmo, lá no fundo do coração que TODOS nós nos DANEMOS! Ano
que vem, é o ano das promessas
que NÃO SERÃO CUMPRIDAS,
ano eleitoral, ano de muito sorriso, beijo em criança,
polêmicas
gratuitas e não esqueçam que esse será mais
um verão
de MERDA , nas lagoas,nas baías, nas praias
e nos rios. Feliz ano velho! MARIO MOSCATELLI - Biólogo - moscatelli@biologo.com.br |
A opinião dos colunistas é de inteira responsabilidade dos mesmos