Meio Ambiente bocadomangue Mario Moscatelli

“DESLEGADOS” DO PAN

Comecei o dia com uma estranha notícia. Em diversos jornais as colunas abriam com: “Agora começou” ou “Feliz ano novo”. Engraçado, para não dizer triste, um país que começa o ano no final de fevereiro, ou no início de março, visto que em muitos lugares a festa se arrasta até a semana que vem.

Enquanto isso, eu pobre mortal, contribuinte achacado, venho pagando impostos desde janeiro, na verdadeira derrama que esses dois primeiros meses trazem para os que desejam manter seus compromissos em dia com nosso “zeloso” poder público. Mas vamos ao que interessa.

Lendo nesse domingo os números estratosféricos que envolvem o “maior evento das Américas”, tais como:
9 mil toneladas de aço, 42 países participantes, 1.480 apartamentos, 330 competições, 2.211 medalhas, gastos através de medidas provisórias do governo federal, envolvendo coisa de R$475 milhões, elevando o investimento no Pan para R$1,284 bilhão, em torno de DEZ VEZES superior, ao gasto inicial previsto, R$135 milhões gastos no Plano de Segurança Pública e finalizando 2.807 camas com mais de 2,10 metros (Suplemento Rio 2007/Jornal O GLOBO).

São números que impressionam, mas que tem tudo haver com um país grande que nem o nosso, onde todos os serviços são prestados com aquela conhecida qualidade que nossos polpudos impostos pagam, ou seja, não falta dinheiro para torrar, principalmente quando não é do bolso “deles” que sai o dito cujo.

Mas aí para estragar estes belos números, lá fui eu sobrevoar a baixada de Jacarepaguá mais uma vez em plena véspera da folia carnavalesca.

Fico impressionado como os dirigentes do COB, salvo meu engano, não têm dado a menor pelota para a questão ambiental que segundo a situação verificada na semana pré-carnavalesca, no meu entender, tem tudo para afundar a festa do Pan.

Minha afirmação está baseada na mesma “previsão mediúnica” que me fez alertar em 2000 sobre as cianobactérias e algas tóxicas e em 2006 sobre a invasão das gigogas nas praias da zona sul, isto é, visitar constantemente o sistema lagunar.

PAN 2007

A vila do Pan atualmente está cercada por um lado pelo arroio Fundo, um verdadeiro valão de M. e do outro lado pela laguna do Camorim, rica em toxinas. O cheiro que emana do arroio é gás sulfídrico e metano puro que em menos de duas horas em contato direto, pode levar a dores de cabeça, irritação nas mucosas e vômitos. É nesse ambiente insalubre que os atletas estarão sendo expostos principalmente se os ventos vierem da Pedra da Gávea, diga-se de passagem, comportamento normal na região na parte da tarde.

PAN 2007

Outro “probrema” é que segundo o que ouvi no rádio, a região da vila está numa das áreas com maior infestação de mosquitos associados com o dengue.

Moral da história, os atletas correm o risco de, ou ficarem intoxicados pelo cheiro, ou pegarem dengue!
O tal legado ambiental de fato, até esse momento, só ficou no discurso, no palanque, pois o que se vê é que o sistema lagunar continua a latrina de sempre, contaminada por esgoto e produzindo cianobactérias, algas tóxicas e gigogas para dar e vender, alimentadas diariamente por milhares de metros cúbicos de esgoto sem tratamento.

A novidade positiva do momento tem sido a ação da secretaria de ambiente do estado do Rio de Janeiro, que além de assumir a gravidade do problema, tem procurado junto ao empresariado local, maneiras de atacar rapidamente de forma articulada, as sérias conseqüências sócio-ambientais da degradação do sistema lagunar, como a suspensão das atividades de pesca na região em virtude da contaminação dos peixes por microcistina (toxina hepatotóxica). Uma das formas levantadas em reunião para se combater o problema sócio-econômico gerado pela interdição da pesca foi a contratação dos pescadores, utilizando-os na limpeza e recuperação dos manguezais, pelo menos enquanto durar a suspensão das atividades de pesca.

PAN 2007

Infelizmente, mais uma vez, ao ambiente de nossa cidade foram prometidas melhoras associadas com mais um determinado evento. Com toda certeza, os prometidos legados para esse mesmo ambiente tão destratado e principal motivo para essa cidade ter sido chamada de Maravilhosa vão continuar apenas no marketing.
Mas não há dúvidas que se não forem tomadas medidas EMERGÊNCIAIS no que diz respeito ao menos ao arroio Fundo, hoje um canal de M., os estragos internacionais para a imagem da cidade do Rio de Janeiro serão certos como uma cidade ambientalmente degradada que tem administradores públicos que desdenham de seu meio ambiente.

Em termos mais práticos, para se ter uma idéia da vingança da Natureza, fruto de nossa acumulada incompetência administrativa, a mancha de tudo que lançamos e produzimos nas lagunas da região, saía do canal da Joatinga e atingia a altura do condomínio Alfa Barra, situado há alguns quilômetros de distância do quebra-mar.

A hora de tomarmos vergonha na cara já passou e o tal evento é daqui há menos de cinco meses.

Depois não digam que eu não avisei.....

Mario Moscatelli - Biólogo - moscatelli@biologo.com.br

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