bocadomangue Mario Moscatelli

A AMEAÇA VERDE

Não tenho mais dúvidas sobre um conjunto de fatos que vem se materializando bem na minha frente, apesar de todos os avisos que por mais insistentes que sejam, parece que estamos, todos nós num claro estado catatônico de pré-catástrofe, do tipo relaxa e aproveita os últimos momentos.

Explico: Há pelo menos quatro anos tenho insistentemente denunciado através dos meios de comunicação, baseado em constatação pessoal e principalmente em estudos científicos realizados pela professora Sandra Azevedo (UFRJ) e sua equipe, a situação CAÓTICA na qual nossas lagunas acham-se chafurdadas. Chafurdadas não apenas em esgoto e lixo, mas também na cianobactéria Microcistys aeruginosa, que confere às águas das lagunas de Jacarepaguá, Camorim, Tijuca e Marapendi um aspecto plástico, como se tivessem lançado tinta verde plástica na água.

Pois bem, além do aspecto suco de abacate, por vezes até “bonito” visualmente, tais criaturinhas são altamente letais, visto que produzem uma substância denominada microcistina que pode causar gastroenterites a danos no fígado para os que delas se utilizam, de alguma forma.


Até aí nenhuma novidade, visto que toda essa história é de conhecimento de todas as autoridades ambientais desde 2000, quando eu pessoalmente, enquanto assessor direto do então secretário de meio ambiente do Estado informei ao mesmo sobre a gravidade da situação. Mesmo assim, apenas depois de muita pressão através dos meios de comunicação é que as autoridades da época se dispuseram a instalar placas em diversos pontos das lagunas alertando a população quanto ao risco que a mesma se expunha ao entrar em contato com aquela “água”.

De lá para cá, as placas de alerta sumiram, o esgoto continua sendo vomitado pelos rios e galerias, as cianobactérias se multiplicando e as pessoas, seja por necessidade, seja por completo desconhecimento do perigo que correm, continuam sob a cumplicidade do poder público se expondo à contaminação generalizada.

Sob a opinião da professora Sandra Azevedo, por mim há muito tempo compartilhada, “... as lagoas deveriam ser interditadas para banho e para pesca.” (O GLOBO – pág. 19 de 24/09/2004). Para se ter uma idéia numérica da contaminação, segundo a pesquisadora, o máximo tolerável para o banho, seria de CEM (100) células de cianobactérias em cada mililitro de água. Só que, prosseguindo com a conhecida mania de grandeza, conseguimos com o atual estágio de degradação ambiental, um número estimado em pelo menos UM MILHÃO (1.000.000) de células por mililitro de água! Aí eu pergunto: As autoridades estão esperando o que para tomar alguma atitude IMEDIATA, pois diante das afirmações acima, não vai dar para esperar a inauguração das obras disso ou daquilo!

Em contrapartida surge um outro problema que é com a comunidade pesqueira da região, visto que a situação caótica gerada, não é apenas um problema ambiental e de saúde pública, mas também e principalmente uma questão sócio-econômica. Dou uma receita: 1- Façam o levantamento da comunidade pesqueira, de quantas pessoas trabalham e dependem da atividade; 2- Criem frentes de trabalho emergenciais para os mesmos pescadores, no momento impedidos de realizarem suas atividades de sustento, devido ao esgoto lançado nas lagunas pelo tempo que as condições de degradação persistirem; 3- Instalem novamente placas de advertência bem como coloquem técnicos nas lagunas fazendo um trabalho de campo, alertando pescadores e freqüentadores dos perigos que correm ao se expor ao contato com as águas contaminadas; 4- Voltem a monitorar biologicamente as lagunas.

É bom lembrar que as cianobactérias como o esgoto, não ficam apenas restritas no interior das lagunas, mas escorrem periodicamente para a Praia da Barra. Diante disso, mostra-se também mais do que recomendável não apenas alertar como interditar para o banho a Praia dos Amores e do Quebra-Mar principalmente na baixa-mar, período no qual tudo que se lança criminosamente no interior das lagunas é regurgitado pelas mesmas para o mar.
Se não se fizer NADA, diante de tudo que foi dito, parece que está na hora de mais uma vez o Ministério Público atuar na defesa do direito à qualidade de vida assegurado por lei à todos os cidadãos.
Terminando, li no jornal de bairro O Globo – BARRA (26/09/04), uma informação que custo à acreditar depois de tantos atrasos e promessas:

“SEM TRATAMENTO – O sanitarista Alaor Santiago adverte que o esgoto bruto continua sendo despejado no mar da Barra. Segundo lei estadual, o esgoto só pode ser lançado no mar por meio de emissário e depois de passar por um processo primário nas estações de tratamento. A Cedae, porém, afirmou em entrevista que a estação de tratamento de esgoto pode ser dispensada temporariamente.”

Como já disse antes na Lagoa Rodrigo de Freitas durante as mortandades de 2000-2001 e 2002, além de não ser levada a sério, a situação caótica de saneamento em nossa cidade já é caso de polícia onde por enquanto “Só Jesus Salva”!

Mario Moscatelli - Biólogo - moscatelli@biologo.com.br

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