bocadomangue Mario Moscatelli
Filho feio não tem pai!
Na
última semana, a Lagoa Rodrigo de Freitas foi palco de mais um capítulo
da melancólica novela política de meio ambiente que envolve nossos
ecossistemas costeiros.
Para entender bem o grau de politicagem que quase provocou um desastre na vida de nossa cidade, precisamos entender algumas poucas e preciosas informações sobre como funciona a bacia hidrográfica da Lagoa Rodrigo de Freitas. Três rios compõem a tal bacia, rio Rainha que desviado de seu curso natural desemboca com suas águas poluídas por esgoto no canal da Visconde de Albuquerque, que por sua vez, para evitar o lançamento dessas águas poluídas na praia do Leblon, desde a administração estadual passada, possui uma comporta que possibilita a captação da água com coco, por uma bomba que lança o material fecal junto ao costão da Niemayer. Por sua vez os rios Macacos e Cabeça desembocam no canal da General Garzon, que também recebe se conecta ao canal do Jóquei. Finalmente as águas do canal da General Garzon desembocam nas águas da Lagoa junto ao clube Piraquê. Finalizando, o principal ponto de escoamento ou ladrão de nossa Lagoa ou caixa d'água, é o canal do Jardim de Alah. Resumindo se o canal do Jardim de Alah estiver entupido, além de ser mais um elemento tensor no frágil equilíbrio da Lagoa, toda a região daquela bacia pode ficar inundada. Basta para isso, chover forte, visto que boa parte do maciço da Tijuca associado ao mirante do Cristo Redentor, drena suas águas para aquela bacia. Exemplo disso foi o corrido em 1997, quando enquanto as "auturidades" se apressavam em colocar a culpa em Iemanjá, alegando que a maré estava alta no horário da chuva, desculpa esfarrapada facilmente desmentida pela tábua de maré que indicava maré - baixa para o horário das chuvas, a Lagoa, o transito, a vida dos Cariocas naufragava nas águas da Lagoa. Detalhe, nenhuma "auturidade" lembrou de dar uma olhadinha no canal do Jardim de Alah entupido e escoltado por uma draga adormecida ao seu lado. As "auturidades" da época só se tocaram do "probrema" quando por meio do Globo Cidade candidamente solicitei à prefeitura que desse uma checada no adormecimento da draga do canal do Jardim de Alah.
Na sexta-feira pós-chuva, quando estive com o secretário municipal de Meio Ambiente, solicitei-lhe que intercedesse junto ao prefeito para que se deixa a burocracia de lado e que diante da falta de recursos do governo do Estado, o município interviesse em nome do interesse público e ambiental no desassoreamento do canal. Além disso, apresentei-lhe a necessidade de um programa de emergência em caso de uma eventual mortandade, pois ver comida ser transformada em lixo era uma vergonha adicional para a nossa Cidade*. Para aumentar a tensão em nossa novela, no sábado passado acessando o WHEATHER CHANNEL, o mesmo alertava para a chegada de uma frente fria arretada, enquanto nosso canal continuava entupido "mais uma vez" e com o nível da Lagoa seguindo a alta da inflação. Enquanto minha boa e paciente esposa me dava a maior bronca por me meter tanto na vida de nossa cidade (até no final de semana!), eu ligava para todos os contatos de mídia disponíveis para alertar aos mesmos, "auturidades", contribuintes e demais passageiros que o iceberg estava vindo em forma de uma frente fria e nosso navio perigava de inundar de vez. Sentindo-me que nem a grega Cassandra, sob ameaça de chuvas torrenciais que posteriormente não se materializaram, coloquei a boca no trombone na segunda-feira. Finalmente pós-bombardeio de mídia, terça-feira, após a assinatura do importantíssimo documento de convênio ou o que o valha, às 20:00, seis dias após o início da primeira frente fria, as dragas que já estavam funcionando como enfeites adormecidos de nossa incompetência administrativa começaram a roncar e desassorear de fato o canal. O nível da Lagoa aos poucos vai descendo e meu ânimo de ver uma cidade ambientalmente mais equilibrada, com ela. Explico: Será que ninguém mais viu no Rio de Janeiro que a situação era grave? Se viu, por que não reclamou? Se não reclamou, aí não sei mais o que perguntar, pois é caso que foge de minha competência de ecólogo. Enfim, mais esse triste capítulo na vida dessa cidade que já foi maravilhosa, e que com certeza terá de viver mais capítulos que de tão dramáticos tornam-se cômicos dado o número de situações grotescas produzidas por administradores que segundo seus interesses político-partidários do momento, expõem a já debilitada qualidade de vida de nossa população a potenciais sacrifícios inúteis em detrimento do quanto pior melhor, pois filho feio é sempre da outra esfera do poder público. Enquanto isso a praia de São Conrado naufragava em fezes e lixo provenientes da favela, comunidade ou nome que vocês queiram dar à Rocinha. Em relação às lagoas da baixada de Jacarepaguá continuam o lixão e a cloaca de sempre. Observação - Fiquei satisfeito de ler pelos jornais uma semana depois, apesar de não ter sido mencionado pelo secretário, que o plano de emergência deverá ser implantado pela secretaria em breve, visto que filho bonito sempre tem pai. MARIO MOSCATELLI - moscatelli@biologo.com.br |
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