bocadomangue Mario Moscatelli

ROLETA RUSSA

A favelização de encostas, manguezais, brejos e demais espaços físicos largados a própria sorte pelo poder público, não é um privilégio do município do Rio de Janeiro. Teresópolis, Cabo Frio, Parati, Angra dos Reis e por aí vai, apresentam a mesma característica e o mesmo resultado fatal.

Vale sempre lembrar que desde dezembro de 2000, periodicamente no começo e esporadicamente de 2001 à 2002, o Projeto Olho Verde, vinha denunciando o que qualquer míope observava da janela de sua casa, isto é, o veloz processo de favelização de todo o eixo da rodovia Rio-Santos. Mangaratiba, Angra dos Reis e Parati sucumbem progressivamente à falta de planejamento do crescimento urbano, onde núcleos populacionais pipocam espontaneamente e de forma induzida por desinteresse e interesses de políticos, gerando verdadeiros assentamentos sem qualquer tipo de infra-estrutura urbana básica. Este processo de favelização que envolve necessidade, pobreza, esperteza, impunidade e o interesse da criação de verdadeiros currais eleitorais, parece não ter fim, apesar de todo o ano as forças da natureza jogarem como numa roleta russa qual dos municípios será sorteado para receber a tromba d'água da vez.

Como eu já disse anteriormente, filho feio não tem pai, e quando acontece uma cagada dessas, do tamanho que aconteceu em Angra dos Reis, dificilmente alguém ou alguma coisa vai assumir o filho feio. Ouvindo as explicações de algumas "auturidades", as mesmas que inventam diariamente mais impostos à serem pagos pela choldra, é como se realmente todas as nossas desgraças estivessem associadas a uma verdadeira campanha de perseguição da natureza contra os desprotegidos e inocentes seres humanos.

É claro que em determinadas condições, mesmo sem favelização, a quantidade de água é tanta que nem com cobertura florestal primária consegue-se deter os escorregamentos, que carregam tudo que estiver na frente. No entanto não dá para fechar os olhos para a ineficiência e a falta de vontade política do poder público no que diz respeito a efetivação de políticas sérias que contemplem o planejamento familiar, o controle do uso do solo, criação de habitações decentes dentre outros aspectos que nos são cobrados e muito bem cobrados por meio de uma centena de impostos, que nós da choldra, não vemos o mínimo resultado na prática.


As chuvas de Angra dos Reis de 2002 com seu resultado fatal, repetem a lição das demais chuvas em 2001, 2000 e por aí vai, que infelizmente somos da cultura do conserto, da remediação, da emoção instantânea, facilmente esquecida. Esquecemos diariamente palavras como prevenção, planejamento, infra-estrutura, fiscalização, moralidade e cobrança. Cobrar a altura do que somos cobrados por estruturas públicas despreparadas, malevolentes, do time da improvisação. Com certeza se chover mais, pode ficar esperando que vai descer mais morro e mais gente vai morrer e todos nós ficaremos em frente de nossos aparelhos de TV ligados nas últimas notícias, emocionados com pais perdendo filhos e vice-versa.

Solução para isso? Olha ando meio desanimado, pois além dos problemas com nossa classe de administradores públicos que em sua maioria raciocina na razão de quatro em quatro anos, temos um pano de fundo cultural bem complicado, visto que a incompetência administrativa vem muito da falta de competência de cobrança da sociedade, e aí amigos e amigas a coisa fica feia! O negócio é se organizar ou se não tiver com se aglutinar, colocar mesmo sozinho a boca no trombone e exigir de quem de direito mais competência. Fora isso, é denunciar ao Ministério Público e à mídia a zona que é a ocupação desordenada de sua cidade e de seu bairro. O que não dá é ficar impotente sem fazer nada!

Aliás falando de impotência, é bom lembrar que nosso órgão ambiental estadual (FEEMA) está funcionando após o incêndio em situação precária, o que é claro interessa aos degradadores e não tem tido a devida atenção de nossa sociedade que parece estar acostumada a conviver com degradação. Precisamos nos mobilizar para que as "auturidades" se mexam e procurem formas para resolver o que é inconcebível, a paralisação das atividades desse importante órgão de controle e licenciamento ambiental. Vamos nos mexer, enviar cartas, e-mails para os jornais e demais autoridades exigindo espaço físico e condições dignas de trabalho. De onde vai sair o dinheiro? Ora, quando as "auturidades" querem o dinheiro sempre aparece ou as vezes desaparece!

MARIO MOSCATELLI - Biólogo - moscatelli@biologo.com.br

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