Outra origem das espécies: Variação da largura das margens alagáveis dos rios contribuiu para a diversificação de animais e plantas na Amazônia.
Outra origem das espécies
29/6/2020 :: Gilberto Stam / Pesquisa FAPESP. CC BY-ND 4.0
Não apenas a largura dos rios da Amazônia – que podem chegar a 20 quilômetros (km) de margem a margem e formam uma barreira respeitável para muitos grupos de animais e plantas – mas também suas margens alagáveis favoreceram o isolamento de populações de animais e plantas e, desse modo, a formação de novas espécies.
De acordo com estudos recentes de pesquisadores do Brasil, dos Estados Unidos, da Finlândia e do Reino Unido, a Amazônia emerge como a fonte – ou, em uma linguagem mais informal, a mãe – das espécies de animais e plantas hoje típicas dos outros ambientes naturais da América do Sul, desde as matas encorpadas do cerradão, na região central do Brasil, até as terras áridas do norte da Argentina.
Um artigo publicado na revista Science Advances em março deste ano apresentou as planícies alagáveis às margens dos rios – as várzeas – como um mecanismo gerador de biodiversidade na região amazônica.
Planícies alagáveis
Formados com sedimentos que vieram dos Andes, do Planalto Central, na região central do Brasil, e do planalto das Guianas, ao norte, esses tapetes de areia fina coberta por lama ocupam uma área de cerca de 300 mil km2, com 10 mil km de extensão – boa parte conectada.
“O nível do oceano ficou mais de 100 metros abaixo do atual no ápice da última glaciação, entre 25 mil e 15 mil anos atrás, e as chuvas mais intensas durante milhares de anos aumentou a força de drenagem do rio Amazonas, que carregava os sedimentos para o mar em vez de depositá-los no vale do rio”, diz o geólogo André Oliveira Sawakuchi, do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (USP), coautor do artigo na Science Advances.
“Nessas condições as várzeas provavelmente desapareciam de alguns trechos, formando barreiras que isolavam as populações de várzeas rio acima e rio abaixo.”
Dinâmica das águas
O isolamento geográfico de populações de animais ou plantas pode gerar novas espécies por causa do acúmulo de mudanças genéticas aleatórias – as mutações. Com o tempo, elas podem ser eliminadas ou preservadas por meio da seleção natural, originando organismos diferentes o suficiente para se comportarem como espécies diferentes.
Durante a estação seca, Sawakuchi explica, os sedimentos que formam as várzeas permanecem fora da água e são ocupados pela vegetação. Ao crescerem, as plantas podem formar uma floresta alagável, coberta pelo rio durante a estação chuvosa. “As florestas alagáveis podem se expandir ou encolher, porque os rios podem acumular sedimentos nos vales ou levá-los para o oceano”, diz o geólogo.
“Se a vazão aumenta com a chuva, o rio transporta o sedimento para o oceano e as florestas alagáveis podem encolher ou até desaparecer de alguns trechos do rio. Elas também ficarão fragmentadas, impedindo o contato entre populações de animais e plantas que ficaram rio acima e as que ficaram rio abaixo do trecho onde a floresta alagável foi destruída.”
Segundo ele, se permanecerem isoladas durante dezenas a centenas de milhares de anos, as populações isoladas poderão evoluir para novas espécies, que entrarão em contato quando a floresta alagável se expandir novamente, aumentando a diversidade biológica.
Artigos científicos
ANTONELLI, A. et al. Amazonia is the primary source of neotropical biodiversity. PNAS. 6034–39. v. 115, n. 23. 5 jun. 2018.
MENEZES, R. S. T. et al. Phylogenomics indicates Amazonia as the major source of neotropical swarm-founding social wasp diversity. Proceedings of the Royal Society B. v. 287, n. 1928, p. 1-9. 2 jun. 2020.
Fonte: Revista Fapesp > Outra origem das espécies