Malária gestacional
Malária gestacional: Identificação de processo inflamatório pode conduzir busca de tratamento para malária gestacional
Malária gestacional
Mar/2020 :: por Maria Guimarães / Pesquisa FAPESP. CC BY-ND 4.0
As mulheres que engravidam em regiões onde a malária é endêmica têm motivos de sobra para se preocupar mais do que o inerente à gestação: sofrem sérios riscos de anemia, aborto, parto prematuro e de terem bebês com baixo peso.
Agora, um estudo com roedores indica que a via bioquímica responsável pelos danos ao feto tem endereço certo e um caminho de medicação, de acordo com trabalho liderado pelo biólogo Claudio Marinho, do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP), publicado hoje (4/3) na revista Science Advances.
Por dois anos o grupo do pesquisador acompanhou 600 grávidas na região do alto rio Juruá, no Acre. Entre as que contraíram malária, parte foi causada pelo parasita Plasmodium vivax (o mais comum na região) e parte por P. falciparum, responsável por mais danos à placenta.
“Descobrimos que as mães que contraíram falciparum, e tiveram bebês com baixo peso, tinham placentas com mais interleucina 1 beta [IL-1β]”, conta Marinho, referindo-se a um marcador inflamatório produzido em resposta à ativação de um grupo de proteínas conhecido como inflamassoma.
Esse sistema detecta sinais de perigo no interior das células e leva a um processo inflamatório para combatê-lo, o que acaba afetando a troca de gases e de nutrientes pelo tecido placentário. “Descrevemos como os transportadores de aminoácidos ficam comprometidos”, completa o pesquisador. O tratamento habitual contra malária pode melhorar os sintomas para a mãe, mas os danos à placenta permanecem.
Na batalha entre plasmódio e placenta, quem sofre é o feto
Detalhar os mecanismos de ação só foi possível graças aos camundongos usados como modelo para malária gestacional, um modelo desenvolvido por Marinho há cerca de 15 anos durante estágio de pós-doutorado no Instituto Gulbenkian de Ciência, em Portugal, um dos centros de pesquisa participantes do estudo atual.
Infectadas com o plasmódio da espécie Plasmodium berghei, as roedoras prenhes apresentam problemas similares às mulheres grávidas com malária, com uma baixa sobrevivência dos embriões. “
A inflamação afeta o espaço intrauterino e muda a fisiologia da placenta”, detalha o biólogo.
Ao produzir camundongos geneticamente alterados com o desligamento de dois genes associados ao inflamassoma, os pesquisadores bloquearam os efeitos adversos da malária gestacional. A prova de conceito do mecanismo foi a aplicação do fármaco Anakinra, usado normalmente contra artrite reumatoide, às roedoras infectadas. Seu modo de ação é justamente o bloqueio da IL-1β. O resultado foi positivo, revertendo os danos à placenta.
No Brasil e no mundo
A África Subsaariana concentra mais de 80% dos casos mundiais da doença, que oferece maiores riscos para gestantes e seus fetos, além de crianças de até 5 anos. Em 2018, cerca de 11 milhões de grávidas nessa região foram infectadas com malária, levando ao nascimento de quase 900 mil crianças com baixo peso. Nesse ano, estima-se que 272 mil crianças com menos de 5 anos tenham morrido de malária no mundo todo, 67% do número total de mortes.
No Brasil o problema não é tão sério. Mesmo assim, o país responde por quase um quarto dos casos do continente americano, que em 2018 foram 929 mil, e teve um crescimento no número de casos entre 2015 e 2018.
O relatório aponta o Brasil como o décimo, entre os países americanos, em termos de financiamento dedicado à malária para cada pessoa em risco de contrair a doença.
> Para saber mais, acesse o artigo completo da Revista Fapesp > Na batalha entre plasmódio e placenta, quem sofre é o feto
Artigo científico
REIS, A. S. et al. Inflammasome activation and IL-1 signaling during placental malaria induce poor pregnancy outcomes. Science Advances. v. 6, eaax6346. 4 mar. 2020.
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