Análise genômica das Américas
Análise genômica das Américas: Análise genômica de quase 6,3 mil pessoas quantifica a contribuição de quatro regiões da África para a composição das populações atuais das Américas
Análise genômica das Américas
Mar/2020 :: por Ricardo Zorzetto / Pesquisa FAPESP. CC BY-ND 4.0
O tráfico de escravos africanos, maior movimento de migração forçada documentado pela história, forneceu a mão de obra que impulsionou o desenvolvimento econômico das Américas nos primeiros séculos de colonização europeia e moldou a composição genética das populações de norte a sul do continente.
De 1514 a 1866, quando ocorreram, respectivamente, a primeira e a última das quase 35 mil viagens registradas de navios negreiros, cerca de 12,5 milhões de pessoas de diferentes regiões da África foram trazidas contra a vontade para essa parte do Novo Mundo.
A maioria – quase 7,6 milhões, ou 61% do total – veio em um intervalo de tempo curto, entre 1750 e 1850. Esse período de maior tráfico transatlântico de escravos coincidiu com o aumento da miscigenação nas Américas, identificada em um estudo publicado hoje (3/3) na revista Molecular Biology and Evolution.
Uma equipe internacional de geneticistas coordenada pelo peruano Eduardo Tarazona Santos, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), encontrou sinais dessa mistura entre as etnias no genoma de nove populações das Américas com ascendência africana estudadas. No trabalho, os pesquisadores compararam o perfil genético de 6.267 indivíduos oriundos dessas populações e de outras 11 da África. “A análise genética encontrou nas populações americanas um sinal de que a miscigenação entre as etnias africanas, e dessas com europeus e nativos das Américas, teria sido mais intensa naqueles 100 anos”, conta Tarazona.
América, mosaico africano
Os dados sugerem que a mistura entre as diferentes etnias começou entre a primeira ou segunda geração daqueles que partiram da África. No entanto, não se consegue saber, ao menos por ora, se ocorreu antes ou depois de chegar às Américas. “É possível que, em parte, tenha ocorrido nos enclaves europeus na costa da África, como as ilhas Cabo Verde ou São Tomé e Príncipe, onde os escravos passavam um tempo antes de serem embarcados para o continente americano, ou nas ilhas do Caribe às quais chegavam em grande número antes de serem enviados para outras regiões”, conta Tarazona.
Uma consequência da vinda de um número tão elevado de pessoas e da miscigenação étnica é que, nas Américas, cada população afrodescendente preserva uma parte importante da diversidade genética de todas as populações que partiram da África entre 500 e 150 anos atrás.
“O número de pessoas deslocadas nessa diáspora forçada foi tão grande que trouxe para as Américas representantes de toda a diversidade genética da África”, conta o geneticista. “Hoje, as populações americanas são como um mosaico das populações africanas ancestrais.”
Aqui, a miscigenação entre as diferentes etnias contribuiu para tornar mais homogênea a componente africana do genoma. Como resultado, hoje, a porção africana do genoma de um afrodescendente brasileiro é mais similar à de um afrodescendente norte-americano do que entre dois indivíduos de diferentes etnias atuais da África. “Até se imaginava que essa homogeneização pudesse ter ocorrido, mas só agora surgiram os dados para confirmá-la”, afirma a geneticista Tábita Hünemeier, da Universidade de São Paulo (USP), que não participou desse estudo.
> Para saber mais, acesse o artigo completo da Revista Fapesp > América, mosaico africano
Artigo científico
GOUVEIA, M.H. et al. Origins, admixture dynamics, and homogenization of the African gene pool in the Americas. Molecular Biology and Evolution. 3 mar. 2020.
Você precisa fazer login para comentar.