Matas Ciliares em Perigo
Matas Ciliares em Perigo: Refúgio de plantas e animais, florestas junto aos rios se tornam suscetíveis ao fogo e são ameaçadas pela agricultura.
Matas Ciliares em Perigo
13/4/2021 :: Por Gilberto Stam
Em 2017, um grande incêndio na chapada dos Veadeiros, em Goiás, queimou 80% da área do parque. Muitas das florestas ripárias, que acompanham os rios, foram parcialmente destruídas.
Essa cobertura vegetal que serve de hábitat e corredor de deslocamento para uma diversidade de animais caiu de 90% para 20% nas áreas mais afetadas, segundo estudo publicado em dezembro na revista Journal of Applied Ecology.
O fogo é parte natural do ecossistema no Cerrado, mas com extensão e frequência menores. Em condições normais, as matas ripárias resistem graças à umidade do ambiente e de suas plantas. Mas essa proteção vem sendo reduzida – nesse bioma e em outros – por falta de manejo, mudanças no regime de chuvas e pelo avanço da agricultura, de acordo com estudos recentes.
“As imagens revelaram que o fogo matou 52% das árvores adultas e 87% das jovens que cresciam na beira dos rios”, explica o biólogo Bernardo Flores, autor do artigo e pesquisador em estágio de pós-doutorado da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). A avaliação foi baseada em imagens da plataforma Google Earth que, com resolução de 0,5 metro (m), permite identificar danos até na copa de uma árvore, quando se compara fotos antes e depois do incêndio, na chapada dos Veadeiros. Em campo, o grupo estudou 30 florestas queimadas e seis áreas não afetadas pelo fogo, que serviram como controle.
Incêndio na beira do rio
“Algumas das florestas devem se recuperar, mas é possível que outras permaneçam aprisionadas por décadas em um estado de vegetação aberta”, ressalta Flores, referindo-se a uma vegetação esparsa e sem árvores frondosas. Os pesquisadores agora monitoram as áreas degradadas para verificar sua recuperação e detectar mudanças na composição de espécies.
Alguns dos locais queimados foram invadidos por plantas exóticas que crescem mais depressa, como o capim adotado pela agropecuária para alimentar o gado e plantas oportunistas, como cipós, trepadeiras e samambaias nativas, que podem ter mais de 1 metro de altura. Essas espécies aumentam o risco de novos incêndios e competem com as árvores, dificultando sua germinação e crescimento.
Buritis e veredas
Algumas áreas de florestas podem se transformar em veredas, um tipo de vegetação campestre em áreas alagadas, onde crescem as palmeiras conhecidas como buritis, cuja produção de frutos aumenta depois de um incêndio.
As veredas, no entanto, não desempenham as mesmas funções ecológicas das florestas ripárias, que são refúgio de vários animais típicos do Cerrado, como o tamanduá, a jaguatirica e a onça-pintada, além de ser moradia permanente de primatas e aves.
As florestas ao longo dos rios também realizam serviços ecológicos essenciais — como purificar a água, evitar a erosão do solo, reter minerais, fornecer alimentos para animais e absorver carbono no tronco das árvores.
“Surpreendentemente, as florestas mais impactadas foram aquelas que alagam durante a estação chuvosa”, diz Flores.
Nessas florestas, a superfície do solo fica repleta de raízes que crescem acima da superfície da água, adaptadas para absorver oxigênio e reter nutrientes da correnteza. Quando termina a época das chuvas e o solo seca, essas raízes entram em combustão com facilidade. Quando há um grande incêndio, elas podem espalhar o fogo pela camada de húmus cheia de raízes que forma um tapete – o chamado fogo de turfa, um dos mais difíceis de combater, porque se alastra de forma invisível ou deixa o solo em brasa.
O efeito da agricultura
O fogo, porém, não é a única ameaça para as florestas ripárias. Um estudo feito em Mato Grosso sugere que a agricultura reduz a diversidade de árvores e altera a composição florística.
“As faixas de florestas ripárias que fazem fronteira com as plantações são particularmente empobrecidas em espécies arbóreas quando comparadas a florestas desse tipo que ficam dentro de uma área florestal”, diz o biólogo Leonardo Maracahipes-Santos.
Autor de artigo publicado na revista Biological Conservation em 20 de novembro, ele é estudante de doutorado no campus de Nova Xavantina da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) e pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam). As áreas degradadas também favorecem a proliferação de espécies colonizadoras, que crescem rápido, mas têm madeira menos densa – por isso absorvem menos carbono e competem com as outras espécies de árvores, diminuindo a biodiversidade.
Estudos:
FLORES, B. M. et al. Tropical riparian forests in danger from large savanna wildfires. Journal of Applied Ecology. on-line. 13 dez. 2020.
MARACAHIPES-SANTOS, L. et al. Agricultural land-use change alters the structure and diversity of Amazon riparian forests. Biological Conservation. v. 252, 108862. 20 nov. 2020.
PAOLUCCI, L. N. et al. Lowland tapirs facilitate seed dispersal in degraded Amazonian forests. Biotropica. v. 51, p. 245-52. 25 fev. 2019.
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