Modelagem epidemiológica
Importância da modelagem epidemiológica: Aprimorados ao longo de 250 anos, os modelos matemáticos de doenças infecciosas, apesar das incertezas, orientam as ações de combate à Covid-19.
Modelagem epidemiológica
Maio/2020 :: Carlos Fioravanti / Pesquisa FAPESP. CC BY-ND 4.0
Com frequência, nas entrevistas coletivas realizadas diariamente desde março no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista, o governador, secretários e médicos afirmam que apoiaram suas decisões em previsões matemáticas feitas por especialistas sobre os possíveis rumos da pandemia de Covid-19 no estado de São Paulo.

Em março, os cálculos dos epidemiologistas do Imperial College, de Londres, convenceram o governo do Reino Unido a adotar medidas mais severas contra a disseminação da Covid-19 e desenharam um cenário da epidemia nos Estados Unidos, que de fato se mostrou calamitoso.
É difícil lembrar de outra situação em que a modelagem matemática de doenças infecciosas tenha usufruído de tanta visibilidade e sido tão prestigiada.

“A valorização se deve provavelmente ao estado de perplexidade gerado pela epidemia, porque ninguém esperava um quadro tão sério”, diz o médico epidemiologista Eduardo Massad, que assumiu o cargo de professor de matemática aplicada na Fundação Getulio Vargas (FGV) no ano passado, depois de se aposentar na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP).
Importância da modelagem epidemiológica
“Nunca antes a modelagem foi tão necessária quanto agora, diante de uma epidemia que avança tão rapidamente”, reitera o sanitarista e epidemiologista Hélio Neves, da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCM-SC-SP) e coordenador do comitê técnico-científico Covid-19 da Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo.

Embora ainda ofereçam incertezas, na medida em que descrevem situações que mudam com rapidez e das quais têm apenas dados incompletos, as previsões do número de casos ou de mortes expressam o conhecimento acumulado durante pelo menos 250 anos.
O matemático e físico holandês Daniel Bernoulli (1700-1782), a quem se atribui a primeira modelagem matemática da propagação de doenças, criou uma abordagem que mostrou a eficácia da técnica de inoculação preventiva contra a varíola, então um problema comum na Europa.
Ele a apresentou em 1760 em dois artigos, um na revista Mémoires de mathématique et de physique e outro na Mercure de France, valendo-se de parâmetros ainda hoje usados para examinar os rumos de epidemias.
Modelagem epidemiológica ganha visibilidade

O surto de cólera de Londres em 1854, que no início de setembro daquele ano matou 127 pessoas em apenas três dias, mostrou a importância do trabalho de campo, complementar aos modelos matemáticos.
Mesmo sem formação específica em epidemiologia, o anestesiologista inglês John Snow (1813-1858) concluiu que a doença era causada por água contaminada de uma bomba de uso público na Broad Street, hoje Broadwick Street, e não pelo ar fétido da cidade, como pensavam seus colegas e autoridades do governo, adeptos da chamada teoria do miasma.
Snow fez um mapa mostrando que as casas dos que haviam morrido estavam próximas à bomba de água contaminada. O mapa convenceu o reverendo Henry Whitehead (1825-1896) da veracidade da teoria da transmissão da cólera pela água e o estimulou a buscar o primeiro caso para refazerem o percurso do surto, com base em seu conhecimento dos moradores do bairro de Soho, onde o surto havia começado e se expandia.
Para saber mais
MASSAD, E. et al. A model-based design of a vaccination strategy against rubella in a non-immunized community of Sao Paulo State, Brazil. Epidemiology & Infection. v. 112, n. 3, p. 579-94, 1993.
MUNIZ, D. G. et al. Vulnerabilidade das microrregiões do estado de São Paulo à pandemia do novo coronavírus (Sars-CoV-2). Pré-print Scielo. 15 abr. 2020.
MAIA, K. P. et al. Vulnerability of micro-regions within Northeast Brazil to the new coronavirus (Sars-CoV-2) pandemic. Pré-print Scielo. 17 abr. 2020.
EMER, C. et al. Vulnerabilidade das microrregiões da região Sul do Brasil à pandemia do novo coronavírus (Sars-CoV-2). Pré-print Scielo. 23 abr. 2020
ROCHA FILHO, T. M. et al. Expected impact of Covid-19 outbreak in a major metropolitan area in Brazil. medRxiv. Pré-print. 14 mar. 2020.
Acesse o artigo completo da Revista Fapesp > Modelagem epidemiológica ganha visibilidade